
Conheci-a no último congresso dos cozinheiros, no final de setembro, onde foi entrevistada pela jornalista Gisele Rech sobre o seu percurso de vida. Alessandra Montagne é uma chef brasileira com dois espaços em Paris e vai em novembro abrir um restaurante em Lisboa. É uma das referências da atual gastronomia parisiense e trabalha ainda com Alain Ducasse para abrir um restaurante no museu Louvre em 2025.
Falou de uma forma apaixonante e assertiva da sua vida, de uma infância difícil e simples, de abusos e da sua mudança para França ainda jovem, já mãe. Mostrou-se uma força de determinação e vontade que coloca na comida que apresenta aos seus clientes. Chega agora a Lisboa, no Cícero Bistrot.


Aconteceu deslocar-me a Paris passado duas semanas e não perdi a oportunidade de marcar um almoço no seu restaurante “assinatura”, o “Nosso”. Este fica no moderno e olimpicamente remodelado arrondissement 13. Encontrei Alessandra a apoiar o serviço de sala e fui recebido com um sorriso largo. Conversamos brevemente sobre a sua passagem pelo congresso e sobre o Cícero, o restaurante de Campo de Ourique.
Quando me sentei, recebi um dos seus miminhos de assinatura, um pão de queijo leve e fofo com caviar. O toque marítimo e salgado do caviar puxou o pão de queijo, tão popular a fazer de blini, para o campo da extravagância. Também chegou um dadinho de tapioca como mimo, antes dos pratos principais.

Com um grande foco na sazonalidade, os dois pratos que pedi foram criados à volta de produtos que nesta altura atingem o seu pico. Primeiro um creme de cogumelos, cuja “sopa” fofa e cremosa cobria uma brunesa dos fungos de várias espécies, revelando uma mistura de texturas a cada colherada, cada vez mais intensa. Depois, um prato que jogava com várias texturas de abóbora, desde a assada, em puré e em pickle, a revelar sabores complementares entre si, regada com um fio de azeite.


Para sobremesa, uma interpretação de um pudim centrada num creme de limão acídulo e intenso. Uma ótima forma de terminar a refeição.
Para harmonizar a comida, fui conversando e aceitando as propostas de Aurélien Gil-Artagnan, o sommelier conhecedor das novas ondas e respeitador da filosofia do restaurante de proximidade com os produtores. Bebi vinhos do País Basco francês, da Provença e terminei com um destilado de baixo grau, experimentalista, muito cítrico, da casa Cazottes.


Acabei por ser o último a sair da sala naquele almoço. Acabei por sentir a sala mais calma depois do ambiente frenético de quem tem de voltar para o trabalho. Fiquei a desfrutar da abordagem que a chefe Alessandra faz da sua cozinha: Uma fusão elegante de duas origens aparentemente antagónicas, a brasileira e a francesa, apoiada em produtos de proximidade e com uma forte componente sazonal. Se não é de época, não vale a pena trabalhar. Fico também a pensar como vai transpor este conceito para Lisboa e para os produtos e tradições portuguesas. Já não é preciso esperar muito para a encontrar em Campo de Ourique.