De material identificável, e apontando para África, em 1940 foi erguido, na margem direita do rio Tejo, o Padrão dos Descobrimentos, uma homenagem às figuras históricas envolvidas no que se apelida como “Descobrimentos portugueses”. A actual réplica, feita em betão e pedra— foi inaugurada em 1960. Seis décadas mais tarde, um modelo em cortiça propõe, na Galeria de Arquitectura do Porto, uma reflexão crítica do passado colonial.
O convite aos Traumnovelle, um dos escritórios de arquitectura belga mais emergentes, para apresentarem um olhar externo especializado, partiu da Galeria de Arquitectura do Porto, através dos seus comissários Andreia Garcia e Diogo Aguiar.
A nova mostra da galeria portuense, apresenta assim The Displaced Monument, que conta com o Padrão dos Descobrimentos no centro da pesquisa, para a qual os Traumnovelle abordam a descolonização a partir de uma intervenção site-specific. A exposição será inaugurada na quinta-feira as 18h00 e conta com o apoio da instituição pública belga Wallonie-Bruxelles Architectures e inclui o lançamento de uma publicação dedicada à exploração do debate com o contributo de diversos investigadores.
O Monumento dos Descobrimentos é um monumento nacional encomendado por António de Oliveira Salazar. Está localizado em Lisboa, local de onde partiram os primeiros navios do século XV e aponta para o Sul, o continente africano: a direcção tomada pelos primeiros “descobridores”. Representa uma idealização romantizada da exploração portuguesa que foi arquétipo do regime do Estado Novo.
Como o monumento celebra a era da Descoberta, encarna também uma história menos romântica de colonização e exploração. Onde o monumento original, feito em pedra branca monumental manifesta um legado de opressão.
Como o monumento celebra a era da Descoberta, encarna também uma história menos romântica de colonização e exploração. Onde o monumento original, feito em pedra branca monumental manifesta um legado de opressão.
Os arquitectos belgas que imaginaram uma nova Europa
A nova edição do ciclo External References da Galeria de Arquitectura é protagonizado por um colectivo fundado por três arquitectos belgas: Léone Drapeaud, Manuel León Fanjul e Johnny Leya, que usa a arquitectura e a ficção como ferramentas analíticas, críticas e subversivas para enfatizar questões contemporâneas e dissecar a sua solução. O colectivo defende o pensamento crítico e multidisciplinar em arquitectura, alternando entre cinismo e entusiasmo, e distanciando-se do lugar-comum em favor a uma nova abordagem da arquitetura.
Eurotopie, o pavilhão belga na Bienal de Arquitectura de Veneza de 2019, é um dos seus mais célebres projectos. “Eu realmente não quero imaginar uma Europa dividida novamente, mesmo que seja a direção tomada em toda a Europa”, declarou nessa altura Jonny Leya, um terço de Traumnovelle. “Então vamos tentar envolver-nos mais”.
As “referências externas” da Galeria de Arquitectura
External Reference é um ciclo de exposições que convida arquitectos estrangeiros a criar uma exposição de arquitectura que considera uma relação específica com o contexto português, visto desde do exterior. Afirmando o espaço da galeria como um palco singular de reflexão internacional sobre o panorama da arquitectura portuguesa, em debate, procura-se fomentar discursos e redes que contribuam para a criação de novas linhas de pensamento sobre o mesmo tema.
Fundada em 2016, no Porto, a Galeria de Arquitectura é um projecto pensado pelos arquitectos Andreia Garcia e Diogo Aguiar na sequência da vontade da criação de um pólo cultural independente que expressasse a Arquitectura e os assuntos que envolvem a disciplina. A partir de exposições, apresentações e debates, o objectivo principal deste projecto é o de fomentar a reflexão e a antecipação de temas ou problemáticas da contemporaneidade arquitectónica.
A partir de um espaço com 6 m2 entre a Faculdade de Belas Artes e a Biblioteca Pública Municipal, e actuando localmente, a Galeria de Arquitectura pretende, em simultâneo, ter um alcance global e repercussão internacional. O espaço propõe-se a expor Arquitectura como um exercício de pensar a própria disciplina e os seus limites. A partir do cruzamento com outras áreas e incluindo a abordagem da disciplina por práticas emergentes, exploratórias ou periféricas, este é um espaço de exposição,
reflexão, debate e inovação, focado no confronto de ideias de Arte, Arquitectura, Design, Cidade e Território. Tirando partido da sua pequena dimensão e comunicando de forma directa e incisiva, este é um projecto de carácter inclusivo que convoca à participação de público especializado mas também do transeunte.
A Galeria de Arquitectura recebeu este ano um dos 15 apoios artísticos do Criatório 2021, atribuído pela Câmara Municipal do Porto.
Andreia Garcia (Guimarães, 1985) é arquitecta, curadora e professora universitária em áreas da arquitectura e da cidade. O seu doutoramento em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa (FAUL, 2015) recebeu o Prémio
Professor Manuel Tainha, pela melhor dissertação no Doutoramento em Arquitetura de 2014/2015 pela FAUL, tendo sido publicado em livro, em 2016, com o título “Espaço Cénico, Arquitectura e Cidade”. Foi responsável pelas curadorias: Smaller Cities (Guimarães Capital Europeia da Cultura, 2012), Projecto Memória (Centenário do Theatro Circo de Braga, 2015), Shaping Shape (Programa de Arquitectura da Bienal de Arte Contemporânea da Maia, 2017), Rythm of Distances: Propositions for the Repetion (Galeira Vertical, 2017), João Álvaro Rocha (MAM, 2018), Endless Space: Propositions for the Continuous (Galeria Vertical, 2017), Fast Forward (MAM, 2019), Double Exposure (Roca Gallery, 2019), Bienal de Arte Contemporânea da Maia (2019). Foi nomeada co-curadora do Anuário 2020, a decorrer em 2021, no Porto. Integra a equipa de candidatura da Guarda a Capital Europeia da Cultura em 2027 enquanto programadora da Arquitectura e dos Projectos Intermunicipais. É cofundadora da Galeria de Arquitectura, no Porto, um espaço independente dedicado à reflexão e ao debate sobre Arquitectura, Cidade e Território no Porto.
Diogo Aguiar (Porto, 1983) é arquiteto, licenciado pela Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP, 2008). Entre 2010 e 2015, é co-fundador e arquiteto principal dos LIKEarchitects, coletivo internacionalmente reconhecido, premiado,
publicado e convidado a participar na representação oficial portuguesa na Bienal de Arquitectura de Veneza, em 2014, comissariada por Pedro Campos Costa – Homeland, News from Portugal. É co-autor do Eco-Resort em Pedras Salgadas, construído em 2012, amplamente publicado e premiado com o Archdaily Building of the Year. Desde 2016, é o arquitecto-comissário da Concreta, a principal feira de Arquitectura e construção do norte do país, procurando estabelecer pontes entre a prática, a profissão e o mercado. Em 2018 /2019, foi Professor Convidado do IADE – Universidade Europeia, em Lisboa, na Pós-Graduação em Design Thinking & Prototyping; e, desde 2020, é Professor Auxiliar Convidado do ISCTE-IUL, em Lisboa.