Encerrou em grande a 12ª edição do Primavera Sound Porto e nem a chuva retirou o brilho do terceiro e último dia que teve concertos extraordinários.
Não estava tanta gente como na véspera (efeito Lana del Rey) e não estavam quatro quintos dos sub-20 que povoaram o recinto no Parque da Cidade nos dois primeiros dias do festival, mas quem esteve assistiu a dois dos melhores momentos da edição 2024.
Na verdadeira linhagem sonora do Primavera Sound Porto, Pulp e The National tiveram prestações com nota de excelência.

Depois de uma tarde marcada pela chuva intensa, à hora dos cabeças-de-cartaz, já com a noite caída, o céu limpou e deu tréguas aos festivaleiros.
No Palco Vodafone, Jarvis Cocker e seus pares foram, absolutamente, fantásticos. Perante uma plateia a fazer lembrar grandes noites quando aquele palco era o principal do festival, os Pulp mostraram e provaram que, mesmo sem a parafernália de tantos espectáculos de variedades que têm passado pelo Parque da Cidade nos inícios de Junho, é possível dar um grande show. Entre a simplicidade de um palco, onde uma simples estrutura de três degraus, a toda a largura do palco, em que os músicos se distribuíam, e um jogo de luzes brilhante, muito fumo e projecções cuidadas, o poder das canções e a atitude e o magnetismo de Jarvis Cocker são os ingredientes suficientes para um grande espectáculo. Não fazem falta bailarinas, coreografias ensaiadas à exaustão e afins. Basta atitude e… música! E foi o que aconteceu no ressuscitado Palco Vodafone com a brilhante actuação dos Pulp.

Quando se tem um repertório de enorme qualidade, músicos de excelência e um frontman que é um senhor, o concerto é uma sucessão de êxitos e os Pulp souberam capitalizar isso perante a massa humana que enfrentavam. O público cedo aderiu e a festa aconteceu, com alguns momentos em que o anfiteatro virou uma autêntica pista de dança.
Jarvis Cocker interagiu amiúde com o público, aproveitando o concerto para lembrar, não só Steve Albini, alma dos Shellac, mas especialmente Steve Mackey, antigo baixista dos Pulp, falecido em 2023. Para os dois Steve que deixaram o reino dos vivos recentemente, os Pulp tocaram a “love song” «Something changed».

Mais à frente, revelando que na próxima sexta-feira (dia 14) vai dar o nó, Jarvis Cocker sublinhou que aquele era “o último concerto como solteiro”, se bem que o mais correcto era ser o último como divorciado, uma vez que, como disse: “Já fui casado uma vez, mas decidi tentar de novo”. De seguida, lembrou a estreia da banda inglesa no Porto, no Festival Imperial no ido Julho de 1998 para introduzir um dos seus grandes hits, «Do you remembre the first time?».
A extraordinária prestação dos Pulp terminou com o inevitável «Common people», num fecho de festa apoteótico.
Dali, muito do público deslocou-se para o Palco Porto onde os The National fechariam com chave de ouro a edição 2024 do Primavera Sound Porto, apesar de a seguir ainda terem subido a palco Arca (Vodafone) e os Mandy, Indiana (Plenitude).

Em duas horas de concerto deu para tudo. Deu para ouvir êxitos de sempre da carreira dos norte-americanos e para ouvir temas do mais recente álbum de originais «First Two Pages of Frankenstein», de 2023, como «Eucalyptus», «Tropic morning news» ou «Alien». Já quanto às pérolas do cardápio da banda de Cincinnati pareceu que foram todas as outras.
Esse festim começou com «Bloodbuzz Ohio», seguiu com «The system only dreams in total darkness» e passou por «Conversation 16», «Day I die», «I need my girl», «England», «Fake Empire», «Light years», «Terrible love» ou «About today».

Depois de ter pugnado pelo “aborto livre em todo o Mundo”, o vocalista Matt Berninger soltou um forte “Fuck Trump” e dedicou o tema «Mr. November» a Joe Biden.
À semelhança de Jarvis Cocker, Matt Berninger, no seu estilo bem diferente do comparsa inglês, mostrou ser um frontman de grande quilate, que sabe lidar como ninguém com o público e interagir com este de forma que não deixa ninguém indiferente.

Musicalmente, os The National foram enormes com a sua mescla de pós-punk e indie rock, ultrapassando por vezes as linhas do shoegaze. Tremendo concerto, que o público, apesar de menos numeroso do que em Pulp, soube apreciar e reconhecer, cantando amiúde a acompanhar Berninger, aliás como já fizera com Jarvis Cocker.
Dois momentos rock monumentais a fecharem a edição 2024 do Primavera Sound Porto e que esperemos tenham mais força nas edições futuras em detrimento dos espectáculos de variedades das Lana e Rosalías desta vida.

Antes, este vosso devoto escriba, depois de ter fintado a chuva (já chegara a molha da véspera no concerto de Máquina), assistiu a mais um concerto de The Legendary Tigerman.
Em versão trio – Paulo Furtado (guitarra, voz e sintetizadores), Sara Badalo (voz e sintetizadores) e Mike Ghost (bateria) –, Tigerman ofereceu o seu rock de sabor norte-americano e, agora, em função do novo álbum «Zeitgeist», mais electrónico.

No entanto, os concertos de The Legendary Tigerman têm uma narrativa sempre igual, em que até as interacções com o público são repetidas concerto após concerto. Lufada de ar fresco é a presença de Sara Badalo que empresta um colorido diferente à actuação, quebrando mesmo essa tendencial repetição que os concertos do autor de «Femina» têm tido ultimamente.

Nota ainda para os concertos molhados e bastante agitados dos norte-americanos Gel e Mannequin Pussy.
Em 2025 há mais, com o Primavera Sound Porto a tomar conta do Parque da Cidade entre os dias 12 e 14 de junho… e esperemos que sem chuva!





