Elefante na sala: o sentido da vida

“A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos não é o que vemos, senão o que somos.” (Fernando Pessoa)

Aviso à navegação. Este artigo vai ser lamechas.

Escrevo estas palavras em viagem. Uma espécie de catarse face ao motivo que me levou a fazer os trezentos quilómetros que separam a melhor cidade do mundo e Lisboa. (eu disse que ia ser lamechas, mas não disse que ia ser apenas isso).

Passamos os nossos dias com um enorme elefante na sala, do qual só nos apercebemos realmente quando enfaixamos de cara numa parede de betão armado, que normalmente se transmuta num acontecimento que coloca a nu toda a fragilidade da existência humana. Vida.

Qual o sentido da vida? Perguntam, e perguntam-se, inúmeros estudiosos, filósofos, teólogos, pensadores, e idiotas alcoolizados, que não têm mais que fazer do que nos arreliar o cérebro com perguntas fúteis. Mas serão perguntas fúteis? Enfrentamos os nossos dias com o pensamento de que a vida é uma simples viagem, que procuramos preencher com algo sem saber muito bem o quê. Invariavelmente valorizamos o palpável dos bens materiais e procuramos “subir de vida” através de uma casa melhor, um carro melhor, um telemóvel melhor… um(a) homem/mulher melhor. O que for, preferencialmente, melhor.

Até que o chão nos foge debaixo dos pés.

Enquanto escrevo estas linhas lembro os poucos anos em que conheci a pessoa de quem me despedi pela última vez hoje. Recordo as vezes que falamos, as mensagens que trocamos em momentos especiais das nossas vidas. As mensagens que trocamos e projetos que desenvolvemos profissionalmente.

Ele seguiu a sua vida, como todos nós seguimos: trabalhar, melhorar de vida, ajudar a família, procurar ter mais e melhor, e ser o melhor a fazer o que fazia. Lutou todos os dias, com um sorriso nos lábios e boa disposição, para conseguir os seus objetivos. Mesmo quando o chão lhe fugiu debaixo dos pés, e teve à sua frente a maior batalha da sua vida, nunca deixou de se preocupar em fazer mais, e melhor.  Aos trinta e dois anos de idade, a sua viagem chegou à última estação e a filha-da-puta da doença cobrou a sua tarifa. Aos trinta e dois anos de idade, a vida do seu filho, de um ano, vai seguir sem ele, e ainda agora começou! A vida da sua companheira de vida, da mãe do seu filho, vai seguir sem ele.

Aos trinta e dois anos de idade não nos passa pela cabeça que a vida nos pode acabar. De repente.

Nem aos 40. Nem aos 50. Não nos passa pela cabeça.

Passa-nos apenas pela cabeça a necessidade de fazermos mais, e melhor, e termos mais, e melhor.

Até que o chão nos foge debaixo dos pés.


Qual é o sentido da vida? É aquele que nós lhe decidirmos dar. Mas com uma certeza: a vida não é uma simples viagem, é a única viagem. Nela temos muitas paragens, em que embarcam e desembarcam pessoas, que se juntam a nós por algum tempo, e que partem. Umas ficam tempo demais. Outras ficam tempo de menos. E dói p’ra caramba quando algumas desembarcam com as carruagens ainda em andamento. Assim. Sem aviso. Partem cedo demais.

A vida é uma viagem e nunca sabemos em que estação vamos acabar por ficar.

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